
Carta 23
28/06/2016 16:37Nova Brasília, [data]
Ao
Camarada Cidadão Patriota.
O Governo Federal decreta a proibição de cultos religiosos, a disseminação das religiões, fontes de lendas anticientíficas, mitos inverossímeis, superstições ridículas, e o ensino e a disseminação da cultura dos silvícolas nativos, que, reconhece o Governo Federal, é o canto das sereias recitado pelos inimigos estrangeiros para seduzir os brasileiros para as causas defendidas pelas Pequenas Tabas e pela Grande Taba, que gozam do apoio incondicional de organizações globais. Está expressamente proibido o uso de vocábulos silvícolas nativos; os nomes das localidades para cuja inspiração se serviu da cultura e do idioma dos silvícolas nativos serão substituídos por nomes dos heróis patriotas que sacrificaram a vida para a conservação da paz e da ordem no território nacional. O Governo Federal eliminou todos os centros de resistência antipatriótica em território nacional, e encarcerou os descendentes dos burgueses capitalistas europeus ocidentais, os dos sórdidos estadunidenses imperialistas e colonizadores e os dos europeus miscigenados nos quais predominou o sangue corrompido dos europeus, fazendo, deles, trânsfugas sórdidos e traiçoeiros. Centenas de milhares de burgueses capitalistas ocidentais escaparam, clandestinamente, do território nacional. Felizmente, o Governo Federal avistou-os nas balsas precárias, com as quais eles - estúpidos antipatriotas - pretendiam empreender a travessia do oceano Atlântico, e aportarem nas terras macabras dos sórdidos estadunidenses colonizadores e imperialistas, e alvejou-os. As balsas emborcaram. Os tripulantes, estúpidos, não sabiam que embarcações tão rústicas não superam nem mesmo marolinhas inofensivas. O Governo Federal, ao eliminá-los, para melhor atender aos brasileiros e conservar a paz e a ordem, impediu-os de disseminar, no exterior, mentiras difamatórias sobre o Governo Federal, o Brasil e o seu humilde e nobre povo, e atrair a atenção da mídia internacional, que está nas mãos de burgueses capitalistas ocidentais, israelitas judeus genocidas e sórdidos estadunidenses imperialistas e colonizadores, oferecendo-lhes pretexto para defenderem, nas organizações globais, políticas hostis ao Brasil e capitalizarem campanhas bélicas contra o território nacional.
As Pequenas Tabas e a Grande Taba intensificaram os ataques ao território nacional. Devastaram cidades inteiras. Espalharam o pânico e o terror. Ceifaram a vida de um milhão de brasileiros patriotas que lutaram bravamente pela integridade do território nacional, e os seus nomes ficam gravados nos livros de História do Brasil. Para desgosto do Governo Federal, com apoio irrestrito do governo russo, do governo chinês, do governo iraniano, do governo libio e do governo egípcio, outrora nossos aliados incondicionais, e de governos de inúmeras nações africanas, os revoltosos antipatriotas, traiçoeiros, voltam-se contra os seus descendentes que vivem neste lado do oceano Atlântico, e agridem o Brasil, com o desejo de suprimi-lo do mapa. A ingratidão das Pequenas Tabas e da Grande Taba não deixa de nos surpreender, e de nos boquiabrir, e de derrubar os nossos queixos de incredulidade. Vivemos tempos apocalípticos. Milhões de cidadãos brasileiros morreram, sob ininterruptos bombardeios desfechados pelos burgueses capitalistas ocidentais e fundamentalistas cristãos. Revidamos, energicamente, aos ataques. Logramos vitórias importantíssimas. Todavia, não ganhamos a guerra, que se estenderá, prevê o visionário Governo Federal, por décadas, talvez séculos, talvez milênios, e repetirá, aqui, neste continente, mas com os papéis invertidos, o conflito entre israelenses e palestinos, que se perpetuará até o fim dos tempos.
Em decorrência da elevação das mortes imprevistas e inevitáveis, o Governo Federal, para impedir o escoamento de vida de soldados e a redução das forças militares federais, estabelece, para todo o povo brasileiro, os ‘modos de morrer’ e as ‘janelas de morte’.
A você fica proibido morrer nos campos de batalhas.
A você ficam reservados três modos de morrer:
1, Esfaqueamento pela cônjuge, que, num ímpeto de fúria ciumenta, atinge seu coração, transpassando-o (ela não poderá esfaquear você por outro motivo; se transgredir essa lei, o Governo Federal a enviará a um campo de concentração, e a submeterá, durante dez anos, a trabalhos pesados e a outros afazeres patrióticos);
2, Acidente de carro, na Via Dutra, no período da manhã, na pista sentido Rio de Janeiro-São-Paulo, numa colisão frontal com um ônibus no qual terá de, além do motorista, haver, no seu interior, trinta e cinco pessoas, sendo dezesseis mulheres e dezenove homens. Dentre as mulheres, duas terão de ser crianças recém-nascidas, uma de idade de sete anos, e três jovens com idade entre quatorze e dezessete anos; dentre os homens, quatro terão de ser brancos, loiros e de olhos azuis de qualquer idade. Na colisão, além de você, terão de morrer os quatro homens brancos, loiros e de olhos azuis. Não se admitirá a morte de nenhum outro passageiro, tampouco a do motorista – do ônibus eles terão de se retirar incólumes, lúcidos e sem arranhões; e,
3, Enforcamento involuntário, ao caminhar por uma favela paulista (permite-se a opção de este evento trágico ocorrer numa comunidade carioca fluminense), nos ‘gatos’, que se proliferaram, nos doze meses anteriores à esta data, à revelia do Governo Federal.
As ‘janelas de morte’ selecionadas para você são:
1, do dia 7 ao dia 14 de janeiro, das 9:00 às 12:00;
2, do dia 16 de fevereiro ao dia 4 de março, das 12:30 às 14:15;
3, do dia 15 ao dia 19 de julho, das 7:00 às 7:30;
4, do dia 30 de outubro ao dia 2 de novembro, das 23:00 às 23:30; e,
5, do dia 6 ao dia 10 de dezembro, das 16:00 às 18:00.
Fica a seu critério a escolha da opção que melhor for conveniente a você e atender aos seus desejos.
Antes de encerrar, o Banco informa: caso você não respeite as ‘janelas de morte’ e os ‘modos de morrer’, e morra em dias e horários e de modo não contemplados na política de salvaguarda à vida, que visa o impedimento da redução drástica da população nacional - o Governo Federal não pode produzir patriotas na medida em que eles são necessários, embora o deseje, para fazer frente aos seus numerosos inimigos -, os seus familiares, nas próximas quatro gerações, ficarão impedidas de possuírem nomes próprios.
O Banco informa, também: o Governo Federal, para a implementação das ‘janelas de morte’ e dos ‘modos de morrer’, medidas que revelam a sua prudência visionária e a sua sensatez heróica, recebeu a chancela de Organizações Globais, que acolhem, em seu generoso e nutriz seio, as nações que, em equivalentes situações nas quais o Brasil se encontra, atuam em benefício de seus povos, nobres e aguerridos, vinculados aos interesses universais de conservação da paz e da ordem.
De
Camarada Cidadão Patriota Missivista Oficial do Sistema Financeiro Nacional.
—————